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Boeing: o gigante dos ares
 

O homem por trás do nome

William Edward Boeing nasceu em Detroit, no primeiro dia de outubro de 1881. De origem alemã, a família de Boeing mudou-se para Seattle, na costa oeste norte-americana.
Boeing cresceu e tornou-se um bem-sucedido empresário do ramo madeireiro. Gostava também, como muitos moradores da cidade rodeada de lagos, de esportes aquáticos. Em 1915, durante a primeira guerra, Boeing e seu amigo Conrad Westervelt, comandante de um esquadrão da Marinha, começaram a acalentar o sonho de construir um hidro-avião, "tão bom ou melhor que os existentes".

Compraram um hidro-avião Martin e estudaram sua construção. Finalmente, criaram seu próprio modelo, batizado B&W 1, que decolou em 29 de junho de 1916. Era o primeiro vôo de um Boeing. Mostraram à Marinha o avião, que logo agradou. Modificações foram feitas, e o novo modelo foi chamado de B&W "C" Model.

Em 1917, é declarada guerra à Alemanha. A Marinha encomenda 50 unidades do C-4 diretamente à Boeing Airplane Company, razão social adotada em 26 de abril do mesmo ano. Com o fim da guerra, a empresa encontrou dificuldades para sobreviver: passou a construir modelos desenhados por outras firmas.

Mas seus projetistas desenvolveram então um ótimo avião, o trimotor para 12 passageiros conhecido como Model 80. Com esta aeronave, em 1926 a empresa venceu a concorrência para iniciar serviços de transporte de correio: nascia uma subsidiária, a Boeing Air Transport. Com esta empresa aérea, muita experiência operacional foi adquirida.

Uma novidade foi a contratação de uma aeromoça (na verdade, uma ex-enfermeira) para cuidar dos passageiros durante os vôos entre S. Francisco e Chicago. Os negócios cresceram tanto que em 1929, uniram-se a Boeing Airplane Company, Boeing Air Transport, Pratt & Whitney (motores) e Standard Steel (hélices) numa holding chamada United Aircraft and Transport Corporation, que seria a precursora da United Airlines.

A Boeing decola

Em 1932, a United adquiriu 60 unidades do Boeing 247, então a mais avançada aeronave feita na América. Para 10 passageiros e 3 tripulantes, voava à 277km/h. Em 1936, outra aeronave que tornou a Boeing famosa começava a sair das pranchetas: voram os primeiros protótipos do B-17 Fortaleza Voadora. Em 1937, outros dois quadrimotores: um terrestre, o Boeing 307, primeiro avião norte-americano pressurizado e o hidro-avião Boeing 314 encomendado pela PanAm.

Com a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra, as encomendas explodiram. Com a fabricação dos B-17 e B-29, a Boeing ganhou valiosa experiência no campo da cosntrução de grandes quadrimotores para vôos de longa distância. Finda a guerra, a empresa desenvolveu um novo avião para transporte de passageiros, o modelo 377 Stratocruiser, que em última análise era um B-29 bastante modificado. Este projeto deu origem ao KC-97, avião-tanque que foi largamente usado (888 unidades) pela USAF.

Boeing em tempos de paz

A vitória sobre a Alemanha nazista rendeu frutos inesperados. Os engenheiros da Boeing tiveram acesso aos projetos alemães, muito mais avançados em campos como propulsão e aerodinâmica. Com estes papéis em mãos, a Boeing desenvolveu seu primeiro jato, o B-47 Stratojet, que com suas seis turbinas, voou em 1950. E já preparou seu sucessor, o famoso B-52 Stratofortress, que viria a voar em 1952.

Estes monstros deram à empresa enorme experiência, capacitando-a a desenvolver o modelo 367-80, o famoso Dash-80, que gerou dois projetos: o Boeing KC-135 Stratotanker, reabastecedor militar e o famoso Boeing 707, o jato que transformou a empresa no gigante do transporte comercial.

Com a força destes sucessos comerciais, a Boeing avançou em outras áreas da indústria aeroespacial. Foguetes balísticos intercontinentais de ataque, o módulo de propulsão do foguete Saturno V (que levaria o home à lua), helicópteros Chinook, barcos hidro-folha, hovercrafts e mesmo um caça tático bi-supersônico são alguns dos projetos da empresa nos anos 60, quando já contava com mais de 100.000 funcionários e fábricas em Seattle e Wichita, Kansas.

Nasce a família Boeing

No campo comercial, o sucesso do 707 dera origem à mais dois modelos: o trijato 727 em 1961, e em 1966 o birreator 737 para etapas curtas. Os anos 60 marcaram ainda dois fantásticos projetos da empresa: o Boeing 2707 supersônico e o primeiro Jumbo, o famoso Boeing 747. O 2707 foi abandonado em março de 1971, quando o congresso norte-americano cancelou a ajuda de custeio. Já o 747 tornou-se o reis dos ares, e a "cash cow", a galinha dos ovos de ouro da empresa.

Os difíceis anos 70

O cancelamento do 2707 e a crise energética de 1973 não ajudaram em nada os planos da empresa. A Boeing porém continuava líder inconteste no mercado civil, tendo entregue seu 3000º jato comercial, um 727-200 para a Northwest, em 1977. Mas as linhas de produção dos 707 e 727 começavam a ver os pedidos minguarem, Além disso, os 737 vendiam devagar: a linha quase foi fechada.

O processo de renovação continuava, embora a passos lentos. A nova e terceira geração de jatos comerciais começava a ser desenvolvida com o anúncio do lançamento, em 1978, dos Boeings 7N7 e 7X7, que viriam a ser respectivamente o 757 e 767, lançados e voando desde 1981.

Em 1973 voa na Europa o primeiro airbus, que viria a ser anos depois o grande rival da Boeing. Os anos 70 vêem a concorrência cada vez mais acirrada entre Lockheed, Douglas e Boeing, que praticamente dividiam sozinhas o bolo da aviação comercial.

No campo militar, depois dos grandes bombardeiros, a participação da Boeing diminuíra consideravelmente: grandes concorrências foram perdidas para estes rivais, que produziram excelentes aeronaves. No caso da Lockheed, o C-5 Galaxy, o C-130 Hércules e o C-141 Starlifter, apenas para citar alguns. Os anos 70 passaram, os 80 entraram e a Boeing manteve-se firme na liderança comercial. Mas ela queria mais.

A megafusão

Donald Douglas Sr. e sua equipe de talentosos engenheiros aeronáuticos ergueram um império dos ares, que entre outros feitos, construiu simplesmente o mais importante e talvez mais famoso avião de todos os tempos: o lendário DC-3. Que outra aeronave comercial dominou a seu tempo, 90% do mercado mundial?

Os aviões construídos pela Douglas e posteriormente, pela McDonnell Douglas, nome adotado pela empresa após a fusão com outro gigante da indústria aeroespacial, sempre foram conhecidos por sua excelência. O destino da McDonnell Douglas serviu para mostrar que no mundo dos negócios, e principalmente, no mundo da aviação comercial, a competição é, de fato, cruel.

Quando do anúncio de sua incorporação pela Boeing, a McDonnell Douglas detinha menos de 5% do mercado de aviões comerciais novos. Engolida pela competidora de Seattle, a empresa de Long Beach produzia vários projetos militares lucrativos, como o Globemaster III e os famosos caças F/A-18 Hornet.

Essa consolidação gerou protestos da principal rival, Airbus. E gerou uma onda de fusões no setor aeroespacial: foi o caso da Lockheed/Martin, da DASA na Alemanha, e da própria Airbus, que teve que finalmente adotar um drástico processo de racionalização para se transformar na EADS.

O gigante e seus inimigos

Passadas as dores do difícil parto que foi essa fusão, a Boeing parece hoje estar disposta a quebrar seus dogmas mais antigos. Ela descobriu, tarde demais, como dizia Tommaso de Lampedusa, "que as coisas precisam mudar para permanecerem como estão". Os anos 90 foram os mais difíceis para a empresa. Afinal, foi neste período que surgiu o único competidor capaz de enfrentá-la. Em número de encomendas, a Boeing perdeu o primeiro lugar como construtora de aeronaves comerciais para a Airbus, algo que não ocorria desde os tempos do 707.

Os 777, gigantes bimotores lançados para substituir os 747 de primeira geração, não encontraram o sucesso esperado: a concorrência imposta pelos A340 e A330 é extrema. Cada nova encomenda é disputada a tapa. No setor de médias distâncias e capacidades, a família dos A320 está vencendo a disputa com os 737 Next Generation.

No front talvez mais visível, o segmento de grande alcance e grande capaciudade, deu-se a derrota mais sentida: o A380 da Airbus, quando entrar em operação em 2006, será o novo Rei dos Ares, destronando o venerável 747. A Boeing apostou num 747 adaptado, incorporando novas tecnologias. A Airbus apostou US$ 10 bilhões num projeto radicalmente novo, um superjumbo de dois andares para até 800 passageiros. Venceu a Airbus, com mais de 100 encomendas para seu A380 contra zero do "novo" 747.

Mas como diz a anedota, a Boeing pode estar é bêbada, mas não está doente. Na semana seguinte ao lançamento formal do A380, a Boeing anunciou uma nova e revolucionária aeronave, batizada tentativamente de Sonic Cruiser. Mais parecido com um foguete futurista dos anos 50, o novo conceito de aeronave propõe enfrentar a capacidade dos A380 com uma arma que está na origem de toda a indústria de transporte: ganhar tempo.

Boeing supersônico?

na conquista do tempo, a Boeing deu uma cartada inesperada: anunciou o Sonic Cruiser , seu mais novo e ambicioso projeto na área de aeronaves comerciais. O Cruiser deverá voar longas distâncias à velocidades limítrofes à barreira do som. Ou talvez, até supersônicamente. Segundo a Boeing, o SC deverá encurtar um vôo transpacífico em consideráveis 3 horas. Vai consumir mais combustível que os aviões de hoje (fala-se em 30% a mais) mas, em compensação, sua produtividade será maior, gastando menos tempo para realizar uma viagem.

A Boeing acredita na fragmentação do mercado, com Sonic Cruisers voando sem escalas entre um grande número de pares de cidades. A Airbus acredita nos céus congestionados precisando de aeronaves de grande capacidade. E vai além: "cortina de fumaça" é como John Leahy, v.p. da Airbus, define o Sonic Cruiser. "Um golpe de relações públicas para afastar a mídia do sucesso do novo A380".

Será? Quem é do ar não se engana, devem estar pensando os executivos da Boeing. Afinal, do alto de seus mais de 26.245 aviões entregues e/ou encomendados desde o pioneiro B&W 1, até os novos e alongados 737-900, 757-300, 767-400 e 777-300, a empresa que começou modestamente, num galpão de madeira nas margens de um lago em Seattle, aprendeu uma ou duas coisas sobre fabricar aeronaves de sucesso. Aguardemos os próximos capítulos.

 

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