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DC-9: rei nas rotas curtas


O Douglas DC-9 e seus sucessores diretos, os MD-80e MD-90, foram o grande sucesso de vendas da Douglas. Se somarmos todos os diferentes modelos e sucessores (exceto o 717) são mais de 2.255 aeronaves vendidas, números impressionantes. Nos seus primeiros 25 anos de vida, esses incríveis aviões transportaram nada menos que 2.5 bilhões de passageiros, voando 15 bilhões de milhas. Mais de 150 empresas compraram e/ou operaram com os DC-9 e seus descendentes. Por falar nisso, seu último sucessor, o Boeing 717, que nada mais é que um MD-95 rebatizado, continua sendo fabricado até os dias de hoje. Portanto, veremos estas máquinas nos céus, por pelo menos mais 30 anos, no mínimo.

O DC-9/MD-80 é um dos projetos básicos de aeronave que mais recebeu desenvolvimentos e incorporou melhoramentos em toda a história da avição comercial. Entre o modelo DC-9-10 e o MD-90, por exemplo, o número de assentos passou de 90 para 180, o comprimento da fuselagem de 31,8m para 46,5m e o peso máximo de 41.4 toneladas para 70.7 toneladas. Somente a dinastia do 737 supera a famosa família desenvolvida pela Douglas nos anos 60.

A história do DC-9 pode ser traçada desde meados dos anos 50, quando a Douglas ainda desenvolvia o DC-8. O fabricante já percebera que a Era do Jato chegara para ficar e começou então a estudar conceitos para jatos de curto alcance para complementar o trabalho dos novos jatos quadrimotores.

Ocupada com o desenvolvimento do DC-8, a empresa de Long Beach tentou inicialmente entrar neste segmento de mercado através de uma aliança com a Sud Aviation. Em 10 de fevereiro de 1960 a Douglas anunciou publicamente que assinara um contrato de cooperação com o fabricante francês para representar o Caravelle em solo norte-americano, desenvolvendo uma versão "americanizada" do jato gaulês. Lançado como Caravelle VIIA, a versão contava com turbinas General Electric CJ805-23C, entre outras adaptações, e fez seu primeiro vôo assim configurado em 29 de dezembro do mesmo ano.

O contrato previa ainda que o Caravelle poderia vir a ser fabricado sob licença pela Douglas, caso as encomendas ultrapassassem a capacidade máxima instalada em Toulouse, que na época era de até 8 aeronaves por mês. Mas tudo não passou de uma vã tentativa, visto que nenhum Caravelle foi encomendado durante este período por operadores americanos, salvo uma encomenda, depois cancelada, de 20 aeronaves para a TWA. Sem compardores, o contrato com a Sud Aviation foi desfeito ao final de 1961. À Douglas restava então partir para seu próprio produto, até porque nestes dois anos da parceria, os engenheiros da empresa californiana tiveram bastanet tempo de estudar a meaquina francesa, aprendendo sobre seus pontos fortes e fracos também. estas lições foram discretamente incorporadas no seu novo produto, que viria a ser lançado um par de anos depois.

Nasce um campeão

Não é segredo que desde cedo a Douglas percebeu que o mercado para pequenos jatos tinha enorme potencial. Estranhamente, nos Estados Unidos ainda nenhum fabricante havia desenhado um produto especificamente para este segmento: o menor jato até então era o 727, para 120 passageiros. A Douglas percebeu o caminho livre e acelerou o desenvolvimento do DC-9.

Com limitações em diversos aspectos, tanto o BAC 1-11 como o próprio Caravelle deixavam aberta a quem quisesse a possibilidade de lançar um novo jato para etapas curtas. Assim, a alta administração da Douglas deu a luz verde para o desenvolvimento do projeto. Inicialmente, a configuração previa um quadrimotor, com uma capacidade equivalente à dois terços do DC-8. O conceito, mostrado tentativamente à algumas empresas, não foi recebido com grande entusiasmo, sendo logo abandonado.

O novo jato foi oficialmente lançado em 8 de abril de 1963, mas ainda sem nenhum comprador oficial, o que não tardou muito. Com a encomenda feita pela Delta Airlines para 30 aeronaves em maio seguinte, o programa ganhou o impulso que precisava para decolar.

Com capacidade projetada inicialmente para 63 passageiros, o novo jato foi desenhado para utilizar dois motores Pratt &Whitney PW JT8-10A-6 ou dois Rolls-Royce RB163-2. A fabricação começou em 26 de julho de 1963 e a montagem do primeiro jato em 6 de março de 1964. Finalmente, o DC-9 da Série 10 fez seu primeiro vôo em 25 de fevereiro de 1965, e entrou em serviço nas cores da Delta Air Lines em 8 de dezembro do mesmo ano. A rota inaugural ligava Atlanta à Kansas City, com escala em Memphis. Configurado para transportar no máximo 90 passageiros, era operado em média com apenas 65 assentos.

Mas as vendas iam devagar: na data de seu primeiro vôo, apenas 58 unidades haviam sido vendidas para a Delta, Bonanza e Air Canadá. Em 1965, a sorte começou a mudar e ao final do ano, os vários modelos de DC-9 já totalizavam 228 encomendas. Um único modelo, porém, ficou sem interessados: o DC-9-5, uma versão incurtada em 2,90 metros em relação ao DC-9-10, que seria capaz de transportar tipicamente 60 passageiros, com pelos máximo de decolagem (MTOW - Maximum Take Off Weight) de 70.000lb. Sem compradores, jamais foi construída nenhuma aeronave desta versão.

No total foram fabricados 137 aeronaves da subfamília DC-9-10, compreendendo as subdivisões DC-9-11 (motores P&W JT8 D-5, MTOW de 77,700 lb), DC-9-12 (motores P&W JT8 D-1 ou D-7, MTOW 85,700 lb), DC-9-14 (motores P&W JT8 D-5 ou D-1, MTOW 86,300 lb), DC-9-15 (motores P&W JT8 D-1 ou D-7, MTOW 90,700 lb). Destes, mais duas variantes para o promissor mercado de carga: os modelos DC-9-15MC (Multiple Change, conversível para carga) e DC-9-15RC (Rapid Change, com remoção de assentos instalados em pallets). E, como curiosidade, o DC-9-10 proipriamente dito nunca voou: este número serviu apenas para designar genericamente a sub-família, uma tradição da Douglas.

Para todas estas versões e, a bem da verdade, para a maioria das aeronaves projetadas pela Douglas, valeu uma das tradições incoporporadas ao DNA aeronáutico do construtor: sua incrível resistência estrutural, bem como a incorporação ao desenho básico medidas e proporções que permitiriam o desenvolvimento de novas variantes. Os DC-9 foram projetados já tendo em mente não apenas os mercados de rotas curtas e baixa capacidade, mas também os eventuais alongamentos de fuselagem para mercados com maior demanda e vôos para etapas médias mais longas. Esta vantagem, uma das marcas registradas do fabricante, seria colocada em uso em seguida e garantiria o sucesso da família DC-9. Esta preciosa lição foi sempre ignorada (ou não cumprida a contento) pelos competidores europeus, o que acabou por lhes custar o couro...

Best Seller: A versão 30

A segunda versão desenvolvida foi a campeã de vendas da família DC-9. Com uma encomenda de 72 unidades feita pela Eastern, a Douglas anunciou a versão 30 do DC-9. Além de incoporar slats e flaps mais complexos, de três slots, com sua fuselagem aumentada em mais 4,57 m e a envergadura em mais 1,22m, a capacidade típica cresceu para 115 assentos, distribuídos em mais 5 fileiras de 5 poltronas (o diâmetro da fuselagem do DC-9 não acomoda 6 assentos por fila). Seu primeiro vôo foi em 1º de agosto de 1966 e a Eastern colocou seus novos jatos em serviço em fevereiro de 1967. Ao final, nada menos que 662 unidades foram produzidas.

Assim como os DC-9 da versão 10, várias sub-versões foram produzidas. para ser mais exato, nada menos que nove modelos: do DC-9-31 com MTOW de 98.000lb até o DC-9-34CF com um MTOW de 121.000lb, quase o dobro do MTOW dos primeiros DC-9-10!

Isso sem falar nos DC-9-30 de uniforme: a Marinha e Força Aérea dos USA encomendaram mais dois modelos, o DC-9-32C9, conhecido como C-9A Nightingale. Um total de 21 aeronaves desta versão, para uso MEDEVAC (Medical Evacuation) foi entregue até 1973. A segunda versão é o C-9A/B Skytrain II, usado como aeronave de transportee logístico, com capacidade para carga, passageiros ou combi. Um total de 17 aeronaves foi entregue a US Navy. E a terceira versão é o DC-9-32VC ou VC-9C, com apenas três unidades construídas para transporte VIP para a USAF, baseados em Andrews.

Em uso civil ou militar, o fato é que a Série 30 ainda é bastante popular nos Estados Unidos. Empresas como a Northwest continuam operando aeronaves do tipo, com modificações e investimentos feitos para com elas voar, pelo menos mais alguns anos. Um avião destes pode ser comprado por um, ou dois milhões de dólares. Já um novo 737 ou A319, não sai por menos de 40, 50 milhões. Muitas empresas optam por adquirir aeronaves de segunda mão.

Vai um parentesis na história do DC-9. Quando falamos em "idade" de um avião, é bom lembrar que esta não é medida pelos anos apenas, tampouco pelas horas de vôo, mas pelos ciclos. Um ciclo é equivalente à um pouso e uma decolagem. E isto é o que importa, pois cada vez que um jato voa, ele têm sua cabine pressurizada, e esta "infla" alguns milímetros. A repetição desta operação tem um limite máximo, pois este ciclo provoca a fadiga do metal que reveste a fuselagem.

Vale lembrar que aviões como DC-9 e o 737, costumam fazer mais ciclos que um 747, por exemplo. É que num dia típico de trabalho, um 747 faz apenas um vôo longo, de dez, doze horas, com apenas um ciclo. Já os DC-9 e 737 fazem, num mesmo dia, oito, até dez vôos curtos, de quarenta minutos, uma hora cada um. Perfazendo um total de oito, dez horas de vôo por dia, fazem oito, dez ciclos. Portanto, normalmente envelhecem mais que rápido que as grandes aeronaves intercontinentais.

Especialidades Escandinavas

A terceira e a quarta versão desenvolvidas do DC-9 foram feitas sob encomenda para um único cliente: a SAS, a empresa aérea formada conjuntamente pelas companhias aéreas da Suécia, Dinamarca e Noruega.

A primeira foi a Série 20: manteve a fuselagem da Série 10 e incorporou as asas maiores e motores mais potentes da Série 30 (JT8D-9 com 14.500lb de empuxo e MTOW de 87.000lb). Fez seu primeiro vôo em 18 de setembro de 1968. Com apenas dez aeronaves produzidos, foi a versão menos vendida do DC-9. Seu desenvolvimento explica-se pois esta versão foi perfeita para a SAS, que precisava desta aeronave para servir aeroportos com pistas curtas. O modelo foi utilizado até recentemente pela empresa, por quase 35 anos ininterruptos.

Após o lançamento da Série 20, a SAS encomendou outro modelo sob medida: a Série 40, uma versão que basicamente conta com a fuselagem da Série 30, ligeiramente alongada em 1.88m. Assim, pode acomodar mais duas fileiras de assentos, elevando o total máximo para 125 passageiros. Seu MTOW chegou a 114.000lb e os motores poderiam ser os JT8 D-15 de 15.500lb de potência. O primeiro vôo de um DC-9-40 foi em 28 de novembro de 1967. No total, a SAS comprou 49 aeronaves, mas somente mais uma empresa adquiriu a Série 40: a TDA do Japão, com mais 22 aeronaves.

O último da série DC

O DC-9 Série 50, foi o último desenvolvimento da aeronave a ser batizado com o famoso designador que significa Douglas Commercial. Anunciada em julho de 1973, esta foi uma versão que teve a fuselagem alongada mais uma vez, num total de 40,71m, e MTOW de 121.000lb, a mesma que o DC-9-34, mas com capacidade para 139 passageiros. Fez seu primeiro vôo em 17 de dezembro de 1974 e foi desenvolvido sob medida para a Swissair. Ao final, 96 aeronaves desta versão foram vendidas.

Em 28 de outubro de 1982, o último dos 976 Douglas DC-9 produzidos foi entregue. Um dos maiores sucessos da empresa, o DC-9 foi responsável pela manutenção da Douglas como uma das líderes do mercado. O DC-9 foi desde o início equipado com um par de motores Pratt & Whitney JT8D, o mais bem sucedido da história. O 727, 737, e tantos outros jatos utilizam estes motores, que foram construídos em número superior a 15.000 unidades.

DC-9 no Brasil... e o fim da linhagem

Um dos países em que os DC-9 fizeram menor sucesso foi justamente aqui no Brasil. A preferência pelos jatos da Boeing, e pelo 737 em particular, tornou as vendas do DC-9 impossíveis por aqui. Em várias partes da América Latina, sobretudo na Venezuela, o DC-9 desempenha até hoje um importante papel. Operado na América do Sul também na Colombia, Suriname e Argentina, os DC-9 e MD-80 raramente foram vistos em operação regular no Brasil. Exceções hoje são os vôos da Surinam Airways para Belém (DC-9-51) e Aerolíneas Argentinas (MD-83/88) para Rio e São Paulo. A Air Aruba (com os MD-88), BWIA (MD-83) e Dinar (DC-9-30 e 40) foram as outras únicas operadoras regulares dos DC-9 e MD-80 em nosso país.

Podemos considerar um sucessor do DC-9, o MD-82, como sendo o único a operar sob o Registro Aeronáutico Brasileiro. Entre 8 de dezembro de 1982 e 13 de março de 1983, um único MD-82 (PP-CJM) foi operado pela Cruzeiro do Sul em rotas domésticas no Brasil. A aeronave foi recebida diretamente em caráter de leasing temporário junto ao próprio fabricante, que acreditava que seria capaz de colocar o MD-82 em operação regular nas cores da Varig, para suplementar os Boeings 737 e 727 usados nas rotas domésticas. Como sabemos, os planos da McDonnell Douglas não surtiram o efeito desejado.

Em meados da década de 70, surgiu uma nova geração de motores, entre eles os Pratt and Whitney JT8D-209, mais potentes, silenciosos e eficientes. Criou-se com sua presença uma plataforma capaz de suportar uma nova versão dos DC-9, maior e mais pesada que a Série 50, a maior até então. Por entrar em serviço no início dos anos 80, a Douglas batizou o novo jato de MD-80, mas fez toda a certificação da aeronave como uma variente do modelo básico do DC-9, o que poupou tempo e dinheiro ao fabricante. Esta história você conhecerá brevemente aqui nas páginas do jetsite.

Gianfranco Beting

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