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Business as usual


Em 7 de fevereiro último, a British Airways anunciou sua entrada num mercado cada vez mais disputado: o das travessias transatlânticas com serviços premium. A BA anunciou a criação de uma companhia dedicada especialmente para este tipo de operação, a "Open Skies". Como o leitor já deve ter visto, já experimentamos um serviço assim, na PrivatAir, operado em nome da Lufthansa, entre Düsseldorf e Newark. Pode conferir na nossa seção Flight Report.

Nas grandes empresas aéreas, esse segmento tem até um nome jocoso: "Os órfãos do Concorde". De fato, desde o fim dos vôos do inesquecível supersônico, o mercado ganhou várias operações "All-Business Class" (ABC). A idéia era atrair o pequeno nicho de mercado que pagava até US$ 12 mil para 3 horas de vôo no SST franco-britânico. Pelo lado Europeu, surgiram a britânica Silverjet, a operação citada da Lufthansa e a francesa L`Avion. Isso sem falar em várias que chegaram perto de iniciar operações e desistiram na última hora, como a bretã Blue Fox. Do outro lado da lagoa, apareceream as norte-americanas Eos e Maxjet - esta, que Deus a tenha, pois encerrou operações em 25 de dezembro último.

Ela é a primeira fatalidade desse segmento cativante, instigante - e terrivelmente difícil para as operadoras independentes. A bancarrota da Maxjet pode em breve ganhar acompanhantes, embora todas as concorrentes citadas afirmem em contrário. Para elas, está tudo, perdõe o trocadilho, "business as usual."

Será mesmo? Em dezembro, a Silverjet apresentou 53% de taxa de ocupação. A Eos foi melhor, com 79%. Mas com o barril acima de US$ 100, é difícil fazer as contas fecharem, sobretudo neste segmento. Analistas acham que com a entrada da BA, com a Lufthansa incrementando serviços para outras cidades norte-americas, pelo menos uma dessas operadoras vai acabar mesmo pedindo água.

O inverno no hemisfério norte é tradicionalmente a baixa estação. Época de matar ou morrer, neste que é talvez o mais competitivo mercado do mundo. Lawrence Hunt, CEO da Silverjet, que opera com apenas dois velhos 767-200 reconfigurados com 100 assentos entre Luton e Newark, esnoba a British Airways. "Fico feliz que eles finalmente acordaram para o fato que o velho modelo de vôos transcontinentais com três ou quatro classes de serviço está totalmente ultrapassado".

Pode até ser. Mas sua companhia teve que liquidar assentos no final do ano, vendendo passagens de ida e volta por 879 libras, quase metade do valor normal.

Na BA e em sua principal concorrente, a Virgin Atlantic, a opinião é de que estas "independentes" criaram um mercado próprio que serve sobretudo os passageiros que moram próximos às suas bases de operação. Segundo ambas as gigantes, nenhuma das companhias ABC aparentemente roubou os passageiros frequentes da BA ou da Virgin. Estas, porém empregaram todas as armas possíveis para defender suas fatias de mercado. Estímulos especiais nos programas de milhagem, incremento de oferta, sutis promoções aqui e acolá nos websites foram algumas das táticas empregadas tanto pela VS como pela BA.

A BA foi ainda mais longe. Para manter cativos os "Órfãos do Concorde", elevou o padrão de serviço na primeira classe entre New York e Londres, sobretudo nos horários nobres aos viajantes de negócios. Um exemplo é a famosa "adega" do Concorde, que continha os mais finos vinhos servidos em anos recentes a bordo de aeronaves comerciais em vôos regulares. Este "Dream Team" das cepas agora é servido na "First" da BA entre Londres e New York. Apenas grandes Bordeaux e Bourgognes, naturellément, constam da carta. Pode ser um detalhe, mas o fato é que esse vale tudo é muito interessante de acompanhar.

As novatas tentam oferecer mais. Os seus preços são mais baixos do que aqueles praticados pelas empresas tradicionais. Os detalhes de produto dessas empresas chamam atenção: check-in rapidíssimo, belas salas VIP, aeronaves equipadas apenas com poltronas-leito (48 por aeronave nos 757 da Eos) e serviço caprichado são algumas. Quem voou, aprovou.

Por falar em check-in rapidinho, a BA pede um tempo de apresentação de apenas 15 minutos antes da partida para atender os executivos da City. Essa é uma das muitas novidades aos clientes desse novo serviço ABC, que será operado desde o aeroporto central de London City Airport (LCA), encravado numa ilha no Tâmisa, em pleno coração da cidade. Os serviços serão operados com Airbus A318. Porém para atravessar o Atlântico desde Londres, uma escala de reabastecimento deverá ser obrigatoriamente feita em Shannon ou Dublin, pois o A318 não consegue sair lotado da curta pista do LCA. Na volta, virá direto de Nova York para o aeroporto central, mesmo que venha com sua casa cheia. A capacidade é para apenas 32 passageiros. Aliás, esses clientes terão como opção, sem pagar a mais por isso, flexibilidade no retorno. Eles poderão voltar em outros horários utilizando vôos regulares da BA, com lugar garantido na classe executiva.

Interessante é notar que, apesar dos resultados destas novas empresas ABC não ser exatamente espetacular, algumas já pensam em diversificar e ampliar as operações. Por exemplo, a Silverjet pensa em dobrar os serviços, inclusive para o recém inaugurado Luton - Dubai. A Eos também anunciou planos de voar para os Emirados, com escala em Stansted, sua base no Reino Unido.

A moda parece que vai pegar também por aqui. Um grupo de investidores trabalha há alguns meses visando lançar uma operação semelhante entre São Paulo e Miami e São Paulo - New York, empregando jatos 767-300ER.

Se a idéia vai decolar, se vai dar certo, ninguém ainda sabe. O fato é que não basta ter apenas o avião com as poltronas-leito. Para atrair o homem de negócios, ou o viajante a turismo mais endinheirado, é preciso oferecer alta freqüência e regularidade nos serviços, planos de incentivo (fidelidade) e muita, muita atenção aos detalhes. Só assim é que o viajante frequente, normalmente fidelizado a um ou mais programas de milhagem, poderá pensar seriamente em mudar de companhia.

Esperamos que essa nova companhia dê certo. Competição de alto nível, multiplicidade de escolhas nunca fizeram mal a ninguém. Nossa aviação precisa mesmo de idéias novas. Com competência - e regras justas - há lugar para todos, das Low-Cost /Low Fare às ABCs.

Gianfranco Beting
29/03/2008

 

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